quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Dedinhos coloridos...

Estava agora buscando na minha Caixa de Entrada todos os emails que a Nega e eu trocamos. Encontrei muitos e agradeci por nunca ter tido o hábito de apagá-los. É tão bom ler e reviver o momento em que aquilo foi escrito! Lembrar das expressões que ela usava, a forma como ela me tratava... Tão bom!!! Tão bom!!!
Esses arquivos tem sido uma ótima ferramenta, através deles vários fatos estão sendo resgatados e poderão ser relatados aqui. Porém, enquanto garimpava as mensagens mais antigas, me peguei pensando em qual seria a lembrança mais remota que eu tinha dela, no fato mais antigo que eu conseguiria lembrar...
Espero e quero lembrar de outros momentos e poder editar esse post em breve, já que hoje, só consegui lembrar disso:
Nascemos e fomos criadas numa pequena e confortável casa de madeira. Somos, respectivamente, a 5ª e a 6ª filha de um casal de agricultores que residem até h0je numa pequena cidade do interior gaúcho, a 232 km da capital Porto Alegre.
Nas manhãs de inverno, a Mãe nos tirava da cama e nos carregava no colo até a cozinha e nos colocava em cima de uma caixa de madeira, uma espécie de baú onde era guardada a lenha, que ficava atrás do fogão, encostada na parede. Em cima da caixa da lenha, ainda de pijama, comíamos pão com marmelada - pão caseiro, na época feito em forno de barro, coberto por uma generosa camada de algum doce de fruta preparado em casa: ximia de pêra, pessêgo ou maçã - e assistíamos a Xuxa na TV.
Terminado nosso café da manhã e já aquecidas pelo calor do fogão, a Mãe trocava nossa roupa ali mesmo, sob os olhos atentos do resto da família. Devidamente alimentadas e vestidas, podíamos partir para a melhor atividade do ínicio do dia: brincar de dedinhos coloridos.
Nossa casa foi construída com madeira de pinheiro - araucária - e algumas tábuas apresentavam nós, círculos no formato do galho que nasceu naquele local. Esses nós, as vezes, se desprendiam da madeira, deixando na parede um buraco redondo, bem bonitinho por sinal. Era isso que tínhamos na parede de trás do fogão: um buraquinho de não mais de 3 cm de circunferência, por onde os raios do sol invadiam nossa cozinha.
Não sei ao certo quem fez a grande descoberta, provavelmente um de meus irmãos mais velhos, só sei que desde que a Mãe nos depositava sobre a caixa da lenha nossas pequenas mãozinhas corriam até o buraco deixado pelo nó e, as gargalhadas, tentávamos tapar o sol. Apertávamos os dedos ao máximo, mas os raios sempre escapavam, nos tingindo de vermelho, amarelo, laranja, as vezes, em tons de azul ou verde.
Eram muitos desafios: tapar o sol, perceber todas as cores e ainda disputar o momento de ter os dedos coloridos. Fecho os olhos e vejo com clareza os dedinhos coloridos da Nega sobre o buraco e a minha mão logo acima da sua. Num único movimento, escorregava minha mão, empurrando a dela para baixo, e, em segundos, já estava gritando:
Olha, Nega, olha: meus dedinho tão transparente!!!
"- Tão nada!! Só os meu ficam transparente!!" - dizia ela, arrancando minha mão da abertura para cobri-la com seus dedos, iniciando mais uma deliciosa batalha matinal que terminava, invariavelmente, com as duas sendo retiradas de cima da caixa da lenha e com o buraco tapado por uma bolinha de papel, que só permaneceria lá até a manhã seguinte.